Inaugurado em 1981, o Monumento a Camões, obra genial do escultor mestre Lagoa Henriques, faz 40 anos agora pelo 10 de Junho.
Verdadeiro ícone da vila de Constância, foi recentemente reabilitado pela Associação da Casa-Memória e traz-nos a lembrança de um Camões ainda com ambos os olhos, fitando a corrente do Zêzere eternamente jovem.
Um dos aspetos que suscita curiosidade e às vezes espanto a quem visita pela primeira vez o Monumento a Camões é o facto de estar representado com os dois olhos e a cara liberta da pala que em geral se associa à sua imagem. A explicação é simples: se o poeta viveu em Constância (então chamada Punhete), como a tradição diz que viveu, terá sido ainda em jovem, cerca de 1546-47, com vinte e poucos anos, antes de partir como soldado para o Norte de África onde, em combate, perderia a vista direita.
O Monumento a Camões foi o primeiro dos três bens patrimoniais associados à memória do nosso épico que a dedicação e a persistência da jornalista Manuela de Azevedo legaram a Constância. Os outros dois seriam o Jardim-Horto de Camões, inaugurado em 1990, e a Casa-Memória de Camões, cujo edifício ficou concluído em 2005.
Nasceu primeiro na cabeça de Manuela de Azevedo e só depois saiu das mãos de Lagoa Henriques. Resultou de uma iniciativa da fundadora da Associação que tratou de reunir as condições necessárias – incluindo, naturalmente, as financeiras – para que a obra se pudesse concretizar, procurando apoios e promovendo uma subscrição pública entre a população de Constância.
Foi a Associação da Casa-Memória de Camões em Constância que pagou as despesas da execução da escultura, tanto o trabalho do escultor como a fundição do bronze e o transporte dos materiais. É essa a razão, porque, ainda hoje, 40 anos passados, apesar de o monumento se encontrar em espaço público, continua a ser a Associação a cuidar da sua conservação, como recentemente aconteceu.
Compõem o Monumento três tipos de peças: a estátua do poeta, em bronze; a estrutura que a enquadra, em betão; e um elemento que exibe uma cronologia e versos do poeta, em mármore. Para a sua realização, Manuela de Azevedo facultou a Lagoa Henriques um conjunto de documentos e de informações sobre a muito antiga tradição popular, passada em Constância de geração em geração, segundo a qual o épico teria vivido, durante algum tempo, sendo ainda jovem, numa casa à beira do Tejo, então já em ruínas, que em tempos tinha tido, no piso superior, uma linda arcaria e que por isso a gente da vila a conhecia por Casa dos Arcos.
Foi por esse motivo que o mestre desenhou a estrutura em betão evocando uns arcos. Em verdade, se Camões, como diz o povo, de facto esteve em Constância, não terá nunca visto esses arcos naquela casa porque, como está sobejamente provado, eles só lhe foram colocados no século XIX, quase trezentos anos mais tarde. Mas, afinal, é a memória dos tardios arcos da casa, enquadrando a figura do poeta, que o Monumento nos transmite.
A inauguração, em 1981, teve honras de chefe de Estado: o Presidente da República, general Ramalho Eanes, certamente ocupado noutro lugar com as cerimónias oficiais do Dia de Portugal, não poderia vir a Constância no próprio dia 10 de Junho. Mas veio antes, a 6, sendo essa a data que consta da placa que assinala o descerramento do Monumento.
Entretanto passaram 40 anos. Muitos milhares de pessoas visitaram a imagem do poeta – na verdade não há ninguém que vá de visita a Constância que não o faça, sentando-se a seu lado, fazendo-lhe um afago, tirando com ele uma fotografia para o levar consigo.
Aos 40 anos – se fosse pessoa, estaria na força da vida! – o Camões de Constância, a mais camoniana das terras de Portugal, aí está, virado para o futuro, para sempre ligado à Vila Poema e jovem, eternamente jovem!
Texto: António Matias Coelho