“O júri decidiu, por unanimidade atribuir, o Prémio à escritora moçambicana Paulina Chiziane, destacando a sua vasta produção e receção crítica, bem como o reconhecimento académico e institucional da sua obra”, anunciou a ministra da Cultura, no seguimento da reunião do júri da 33ª edição do Prémio Camões.
O júri referiu a importância que a escritora dedica, nos seus livros, aos problemas da mulher moçambicana e africana, destacando o seu trabalho recente de aproximação aos jovens, nomeadamente na construção de pontes entre a literatura e outras artes.
“O Prémio Camões 2021 serve para valorizar o papel das mulheres numa altura em que o seu trabalho ainda é subvalorizado”, declarou Chiziane, depois de receber a distinção.
“Afinal a mulher tem uma alma grande e tem uma grande mensagem para dar ao mundo. Este prémio serve para despertar as mulheres e fazê-las sentir o poder que têm por dentro”, referiu.
Chiziane foi a primeira mulher a publicar um romance em Moçambique, com “Balada de amor ao vento”, em 1990.
“Quando comecei a escrever, ninguém acreditava naquilo que eu fazia. Porque eram escritos de mulher”, referiu, numa alusão à temática do género, um dos fios condutores da sua obra.
A escritora, de 66 anos, confessou-se “confusa com a notícia do prémio”. “Eu nem sequer me lembrava que o prémio Camões existia”, porque os confinamentos provocados pela covid-19 deixaram-na “bem fechada em casa, desligada de tudo”.
“Uma surpresa muito boa para mim, para o meu povo, para a minha gente”, que em África escreve “o português, aprendido de Portugal”, referiu.
“E eu sempre achei que o meu português não merecia tão alto patamar. Estou emocionada”, acrescentou.
O seu último trabalho foi “A voz do cárcere”, escrito em conjunto com Dionísio Bahule, lançado este ano, em Maputo, um trabalho baseado na recolha de testemunhos em prisões moçambicanas.
A obra de Chiziane, que tem tido edição portuguesa, cruza identidades (à imagem da biografia da própria escritora), cruza linguagens literárias e orais, e cruza histórias de violência, as da subjugação feminina e as que são herança de duas guerras, a guerra da independência e a guerra civil.
Chiziane é primeira mulher a publicar um romance em Moçambique (em 1990), “muito empenhada cívica e politicamente”. A autora de “Niketche: Uma História de Poligamia” tem dado voz a traumas recentes e a combates ainda em curso, testemunho cujo impacto o Prémio Camões veio agora reconhecer e consagrar.