Depois de uma sucessão de polémicas com escolhas do Governo que levaram à demissão de vários secretários de Estado, o Executivo decidiu avançar com um mecanismo para assegurar maior robustez das nomeações: um questionário de 36 perguntas e uma declaração de honra que tem de ser assinada pela pessoa escolhida. Esta solução está a merecer críticas da esquerda à direita, com acusações de ser uma “mão cheia de nada”, nomeadamente por serem questões “óbvias” num processo que é da responsabilidade do primeiro-ministro.
O novo questionário foi apresentado na passada quinta-feira por Mariana Vieira da Silva, no final da reunião de Conselho de Ministros que se alongou muito para além do habitual, e contempla questões sobre a situação profissional e fiscal, a participação em empresas, atividades dos familiares, conflitos de interesse e envolvimento em processos judiciais.
À direita, Luís Montenegro apelidou o exercício de “ato de ‘inconseguimento’”, na entrevista à SIC na noite passada. “Aquilo que o Governo veio dizer são coisas óbvias, redundantes, níveis de interação com as pessoas que escolhem que presumo que sejam normais”, reiterou o líder do PSD, nomeadamente “saber o que fez, o que faz, o que tem como potenciais problemas que possam vir a influenciar desempenho de funções”.
Para Montenegro, esta “é uma tentativa falhada do primeiro-ministro de se desresponsabilizar de responsabilidade que é exclusivamente sua”. António Costa chegou a admitir uma solução após a comunicação do nome à Presidência, mas Marcelo Rebelo de Sousa recusou, acabando por dar luz verde à medida encontrada pelo Governo.
André Ventura, do Chega, considerou esta solução uma “cortina de fumo inútil”, reiterando que “o Governo vai fazer o escrutínio que está a fazer até agora, em círculo fechado e interno com única responsabilidade do primeiro-ministro ou alguém que designe”, em declarações aos jornalistas transmitidas pelas televisões. Não sendo uma obrigação legal, é um “mero mecanismo interno e, portanto, não resolverá nenhum problema”, concluiu.
Já João Cotrim Figueiredo disse que “a montanha pariu um rato”. “Alguma das perguntas não pode ser apurada no normal processo de escrutínio? O que se pretende”? questionou, no Parlamento. O deputado da Iniciativa Liberal pergunta se a ideia era “corresponsabilizar o Presidente”, cuja atuação critica por acabar por “fazer parte desta solução”, que “é uma mão cheia de nada”.
À esquerda, Paula Santos, do PCP, defendeu que era necessária mais uma dimensão. “Independentemente do conjunto das perguntas que constam do questionário, há outro aspeto nesta avaliação: a necessidade de se ter em conta o compromisso com a defesa do interesse público”, em declarações transmitidas pelas televisões.
Quanto ao Bloco de Esquerda, o partido também questionou se antes não faziam estas perguntas, defendendo que “todos os casos que aconteceram têm um responsável” que é o primeiro-ministro, António Costa. “Sobre este questionário aos eventuais membros do Governo, devo dizer que no mínimo – e para não ser demasiado cáustico para com o Governo – é ridícula toda esta encenação”, atirou Pedro Filipe Soares, em declarações aos jornalistas.