O ensino da língua e da cultura portuguesas no estrangeiro constitui um vetor fundamental da ligação das nossas comunidades ao país e um dos elementos estratégicos da afirmação de Portugal no mundo. Daí que, a valorização de todos os graus de ensino da língua e da cultura portuguesas no estrangeiro, do ensino básico ao universitário, será sempre central no âmbito da política externa nacional.
A vasta presença de portugueses e lusodescendentes em todos os continentes, e a ambição que existe para a língua portuguesa como língua global e de trabalho nas instituições internacionais, impele naturalmente ao reforço das políticas públicas que permitam a afirmação da língua e da cultura portuguesas nos vários graus de ensino no estrangeiro.
Também têm existido períodos mais difíceis, como aconteceu no auge da crise económica e financeira de 2010-2014, quando se registou um retrocesso no Ensino Português no Estrangeiro (EPE), com a supressão de 122 professores da rede pública, sendo que 49 foram retirados do ensino já depois do início do ano letivo, em 2012, deixando alguns milhares de alunos sem aulas em França, Suíça e Espanha. Desde 2015, a aposta no robustecimento do Ensino Português no Estrangeiro (EPE) tem sido clara, não obstante o período da pandemia ter provocado dificuldades, regista-se novamente um aumento no número de inscrições de alunos.
O EPE deve ser devidamente analisado à luz das especificidades de cada país, fator que cria uma diversidade no tipo de oferta de cursos para os alunos, que passa pelos chamados ensino paralelo, integrado e complementar, bem como pelo ensino bilingue, pelo ensino associativo e pela rede apoiada, criando realidades muito distintas, num contexto de grande heterogeneidade quanto ao domínio da língua.
Esta diversidade exige uma pedagogia adaptada aos níveis de desempenho linguístico na sala de aula, com professores devidamente formados e motivados, para formar turmas homogéneas ao nível da proficiência linguística, com contextos familiares muito distintos. Deste modo, o EPE é mais eficiente perante as realidades sociológicas diversas em que existe.
Com efeito, o EPE também se caracteriza pela sua capacidade de adaptação às condições da oferta e à cultura educativa e às práticas administrativas de cada país e, não menos importante, à grande dispersão das nossas comunidades pelos países de acolhimento.
A verdade é que houve uma mudança de paradigma na perceção da importância da língua portuguesa, que começou a distanciar-se a partir do início deste século da sua condição de língua de emigração e a fazer o seu caminho como língua global, a quarta mais falada no mundo como língua materna, a mais falada no hemisfério sul e com grande margem de progressão, particularmente devido ao crescimento demográfico em África.
Com a vantagem de poder contar com a intervenção da rede diplomática e consular nacional para prosseguir os seus objetivos, o EPE adapta-se ao sistema de ensino de cada país, afirmando a língua portuguesa como língua de projeção internacional,
Em 2007 surgiu o primeiro estudo que fundamenta o valor económico da língua portuguesa, permitiu a valoriza como língua de trabalho, de comércio, de cultura e de ciência. Um ano antes, em 2006, foi feita a alteração legislativa ambiciosa que consubstancia esta mudança de paradigma com a aprovação do Decreto-Lei nº 165, sublinhando não apenas a centralidade do EPE, mas também o objetivo de fomentar a difusão internacional da língua portuguesa.
Refere o diploma que existia então “a perceção generalizada de que é necessário desenvolver uma política mais ambiciosa para a Língua portuguesa, baseada num esforço persistente de promoção do seu ensino e do seu estudo à escala mundial, dado o seu estatuto de língua de comunicação internacional”.
Para que estes objetivos ambiciosos fossem alcançados, o Governo de então procurou desenvolver os meios para valorizar e qualificar o ensino e a aprendizagem da língua portuguesa no estrangeiro, adotando as melhores práticas internacionais do ensino das línguas, designadamente as que seguem o Quadro Europeu Comum de Referência para as Línguas: Aprendizagem, ensino, avaliação (QECR), de 2001, elaborado pelo Conselho da Europa, QuarEPE, de 2011, desenvolvido a partir do QECRL, e o Referencial Camões, Instituto da Cooperação e da Língua, I.P. (Camões, I.P.), desenvolvido a partir dos outros dois referenciais aludidos e com abordagens no domínio da língua de herança.
Foi a partir daqui que se desenvolveu verdadeiramente um processo de constante valorização do ensino da língua portuguesa no âmbito da elaboração e avaliação de programas, linhas de orientação curricular e escolha de materiais pedagógicos e didáticos, que procuravam assim “o pleno reconhecimento, acreditação e certificação dos cursos do ensino Português no estrangeiro”.
Desde 2015, tirando o hiato da pandemia, que se verifica uma nova evolução favorável, ao nível do número de alunos, professores e escolas e presença no ensino superior.
Ora, é esta ambição que deve continuar presente no que concerne ao EPE, procurando ser sempre cada vez mais valorizado e reconhecido, mas igualmente mais atrativo e abrangente, consolidando a certificação das aprendizagens para terem um valor acrescido em termos pessoais e profissionais.
Para isso, certamente que as verbas agora destinadas à digitalização do EPE, oriundas do PRR e inscritas no Orçamento de Estado para 2023, permitirão dar um salto qualitativo muito relevante na modernização do ensino, que certamente criará maior motivação para a aprendizagem, além de ter potencial para chegar a novos públicos e aos alunos que agora estão mais dispersos e longe dos centros onde existe grande concentração de portugueses e lusodescendentes.
Por outro lado, o recurso à utilização das tecnologias digitais aplicadas ao ensino, mais adaptadas à cultura tecnológica que acompanha os jovens de hoje, possui todo o potencial para tornar o ensino da língua portuguesa mais atrativo, dinâmico, interativo e ajustado ao perfil dos alunos residentes no estrangeiro.