O Observatório da Emigração apresentou, em dezembro último, os dados referentes à emigração nacional em 2020 e, de acordo com este organismo, o número de emigrantes portugueses a sair do país foi “o mais baixo dos últimos 20 anos”.
Como seria de esperar, os fatores pandemia e o “Brexit” estiveram na origem desta quebra “sem precedentes” na saída de cidadãos nacionais para o estrangeiro.
Foram cerca de 45 mil cidadãos portugueses saídos do país em 2020, o que compara com os 80 mil que saíram em 2019, uma queda de mais de 50%, segundo o Relatório da Emigração 2020, apresentado a 21 de dezembro no Ministério dos Negócios Estrangeiros, em Lisboa.
O relatório, elaborado pelo Observatório da Emigração, um centro de investigação do ISCTE – Instituto Universitário de Lisboa, indica que a redução “foi geral”, e engloba praticamente todos os destinos “tradicionais” da emigração portuguesa.
A pandemia foi apontada como o principal fator a impactar a saída de portugueses para o estrangeiro em 2020, através de “limites à mobilidade internacional com objetivos sanitários e a crise económica que resultou das políticas de confinamento para interromper as candeias de contágio”.
Por seu turno, o ‘Brexit’ (a saída do Reino Unido da União Europeia) contribuiu através das barreiras às migrações para o Reino Unido, na sequência do plano da saída deste país do espaço europeu de livre circulação. O Reino Unido tinha sido, em 2019, o principal destino da emigração portuguesa, mas foi destronado da posição em 2020 pela Suíça.
Os números refletem estas mudanças, uma vez que, em 2020, emigraram para o Reino Unido menos 18 mil portugueses do que no ano anterior, o que representa “a maior quebra do século na emigração para este destino”.
Os dados do Observatório indicam que a emigração portuguesa continua numa tendência de declínio (que começou em 2014), um fenómeno que se explica pela “retoma do crescimento económico em Portugal, expresso na revitalização do mercado de trabalho, com crescimento do emprego e descida do desemprego”.
Enquanto a taxa de emprego cresceu de 49,7% em 2013, para 54,1% em 2020, e a de desemprego desceu, no mesmo período, de 16,2% para 6,8%, “a emigração não se reduziu com a mesma velocidade da recuperação económica, pois o grande crescimento do número de saídas na fase anterior traduziu-se na revitalização e criação de redes entre origem e destino que tornam hoje mais fácil e provável a escolha da emigração como trajetória de mobilidade, mesmo com incentivos económicos mais reduzidos”, refere o documento.
Principais destinos da emigração
Na mais recente análise feita pelo Observatório, são incluídos dados das Nações Unidas que indicam que, em 2019, haveria no mundo um pouco menos de 2,6 milhões de pessoas nascidas em Portugal a viver no estrangeiro, o que representa cerca de 25% da população residente no país naquele mesmo ano.
Estes dados apontam para um crescimento da proporção de emigrantes portugueses a viver na Europa e assinalam também uma manutenção da emigração portuguesa no continente americano e um maior crescimento da fixada em África.
Em 1960, de acordo com os cálculos do Banco Mundial, viviam na Europa 16% dos portugueses emigrados. As estimativas das Nações Unidas indicam uma percentagem de 58%, em 1990, que se manteve nos 57%, em 2019.
Segundo esta organização, Portugal era, em 2019, o 26.º país do mundo com mais emigrantes. Na Europa, apenas sete países tinham populações emigradas mais numerosas: Federação Russa, Ucrânia, Polónia, Reino Unido, Alemanha, Roménia e Itália.
Em termos do número de emigrantes pela população do país de origem, Portugal apresentava uma taxa de emigração de 26%. Neste indicador, Portugal era o oitavo país do mundo com mais emigrantes. Portugal era, em 2019, o primeiro país da União Europeia com mais emigrantes em percentagem da população: 25,7%.
O relatório indica ainda que, em 2020, existiam 600 portugueses e lusodescendentes eleitos ou nomeados para cargos públicos no estrangeiro.
Este valor reflete uma descida de 15% em relação ao ano anterior, uma variação que resulta, em grande medida, da redução do número de luso-eleitos identificados em França, sendo parcialmente compensada pelo aumento registado nos Estados Unidos.
A Europa é o continente onde se encontra a grande maioria dos luso-eleitos (71%), seguindo-se a América (26%), África (2%) e Ásia/Oceânia (1%).
A lista é liderada pela França (62%), seguindo-se os Estados Unidos (25%) e a Alemanha (6%).
No que diz respeito ao recenseamento eleitoral, com a extensão do recenseamento automático também aos portugueses residentes no estrangeiro, a partir de 2018, são contabilizados atualmente 1,5 milhões de cidadãos recenseados no estrangeiro.
Quanto ao associativismo, um setor muito afetado pela pandemia de covid-19, devido ao cancelamento de iniciativas decorrentes das limitações impostas, o Estado português apoiou 34 associações, distribuídas por 12 países, o que representou um encargo de 491.588,31 euros.
Remessas de emigrantes em 2020: Suíça destrona França como principal país emissor
As remessas dos emigrantes portugueses totalizaram, em 2020, 3.612 milhões de euros, mantendo-se a diminuição registada no ano anterior, com os residentes na Suíça a enviarem o maior valor para Portugal.
O último Relatório indica que as remessas financeiras provenientes da emigração portuguesa têm verificado uma tendência de crescimento, interrompida em 2019, que se manteve no ano passado.
O valor total recebido foi de 3.612 milhões de euros, o que representa 1,8% do Produto Interno Bruto (PIB) nacional.
A França, que liderava em termos do maior valor de remessas enviadas para Portugal, passou para segundo lugar, com a Suíça em primeiro, após uma subida de 4,9% no volume dessas remessas, que aumentaram de 988,70 milhões de euros em 2019 para 1.037 milhões em 2020.
Ainda assim, a França mantém-se como um dos países com mais transferências para Portugal: 1.036,6 milhões de euros em 2020, e também o Reino Unido (379,4 milhões de euros), Angola (245,5 milhões de euros) e os Estados Unidos (244 milhões de euros).
A Alemanha (225,9 milhões de euros), a Espanha (111,8 milhões de euros), o Luxemburgo (78,4 milhões de euros), a Bélgica (58,9 milhões de euros) e os Países Baixos (44,5 milhões de euros) também constam desta lista de maiores valores enviados pelos trabalhadores portugueses.
Em termos globais, verificou-se um decréscimo em quase todos os países, com exceção para a Suíça, Reino Unido, Estados Unidos, Venezuela, Bélgica e Países Baixos.
No ano em análise, 90,9% das remessas tiveram origem em países da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE), 44,1% na União Europeia e 7% nos Países Africanos de Língua Oficial Portuguesa (PALOP).
No contexto internacional, Portugal ocupava, em 2020, o 34.º lugar em relação às remessas recebidas pelos seus emigrantes, depois de ocupar o 32.º lugar em 2016, o 31.º em 2017, o 33.º em 2018 e o 36.º em 2019.
Índia, China e México são os países com mais remessas recebidas pelos seus emigrantes.
Reino Unido liderou aquisições de nacionalidade dos emigrantes portugueses em 2020
O Reino Unido deixou de ser o principal destino dos emigrantes portugueses em 2020, mas liderou as aquisições de nacionalidade dos cidadãos nascidos em Portugal, para o que terá contribuído o ‘Brexit’, segundo o Observatório da Emigração.
Em 2020 registaram-se 2.042 aquisições de nacionalidade britânica por parte dos emigrantes portugueses.
“Este fenómeno parece explicar-se, sobretudo, pelos receios induzidos pelo ‘Brexit’ e pela redução de direitos associados ao estatuto de estrangeiro que daí poderá resultar”, lê-se no estudo elaborado pelo Observatório da Emigração.
Em termos de aquisição de nacionalidade do país de destino por portugueses, seguiu-se a Suíça (2.008), a França (1.794) e os Estados Unidos (1.712 em 2019).
Os portugueses representaram, em 2020, 10,4% dos estrangeiros que obtiveram a nacionalidade luxemburguesa – uma percentagem que aumentou pela primeira vez nos últimos quatro anos – e 5,9% dos estrangeiros que obtiveram a nacionalidade suíça, a percentagem mais baixa verificada nos últimos seis anos.
Os autores do relatório analisaram os países com valores perto do um milhar de aquisições de nacionalidade do país de destino e observaram uma variação negativa em todos eles, de 2019 para 2020, sobressaindo-se a Suíça (-28,7%), o Reino Unido (-8,3%) e o Luxemburgo (-8,1%).
“Tal se pode dever, em termos globais, ao impacto da covid-19 nos processos administrativos, e no caso do Reino Unido, também ao facto de o processo do ‘Brexit’ ter já finalizado. Já nos casos do Luxemburgo e Suíça, países com alterações recentes, liberalizantes, dos seus regimes de nacionalidade, é provável que se esteja a verificar um progressivo esgotamento do stock de pretendentes à nacionalidade do país de residência que se tinha acumulado antes daquelas alterações”, prossegue-se no documento.
Menos portugueses expulsos do estrangeiro. Pandemia atrasou processos
As autoridades internacionais expulsaram 436 cidadãos portugueses em 2020, menos 219 do que no ano anterior, uma diminuição em parte justificada pelos atrasos nos processos devido às limitações impostas pela covid-19.
O Relatório da Emigração 2020, indica que, neste período, foram expulsos ou deportados para Portugal 436 cidadãos.
A maioria dos cidadãos encontravam-se em países europeus (342) e 94 no resto do mundo.
Dos 342 cidadãos portugueses oriundos de países da Europa, o maior número foi afastado da França (103), Bélgica (78) e Reino Unido (70). Também foram expulsos da Alemanha (oito), sete de Andorra, 24 de Espanha, um da Hungria, um da Islândia, 10 do Luxemburgo, 27 da Noruega, sete dos Países Baixos, um da Rússia e cinco da Suíça.
Os autores do relatório dão particular atenção ao Reino Unido, embora o número de expulsões tenha diminuído de 223 em 2019 para 153 em 2020.
Trata-se de expulsões por antecedentes criminais (no final do cumprimento das respetivas penas ou ao abrigo de mecanismos de libertação antecipada) e expulsões administrativas (resultantes do não preenchimento dos requisitos para o exercício da livre circulação de pessoas, aplicável até ao final do período transitório estabelecido no Acordo de Saída).
Em relação ao resto do mundo, as 84 expulsões ocorreram em maior número no Canadá (45) e Estados Unidos (30), mas também do Brasil (nove), Cazaquistão (um), China (um), Emirados Árabes Unidos (dois), Filipinas (um), Marrocos (um), Moçambique (um), Nicarágua (um) e Nova Zelândia (dois).
O relatório indica ainda que, no final de 2020, existiam 1.223 cidadãos portugueses detidos no estrangeiro, valor bastante inferior ao registado em 2019 (1.716).
Em 2020, o Estado português apoiou 119 repatriações de cidadãos nacionais que se encontravam no estrangeiro, desprovidos de meios para regressar a Portugal.
Este número representa um aumento de 116% repatriações em relação a 2019 (55).
Conforme a legislação em vigor, o Estado português adiantou a verba para este regresso, sendo que mais de metade das repatriações teve origem fora da Europa (65), com destaque para a Tailândia (16), Brasil (14), Estados Unidos (seis), África do Sul (cinco) e Angola (cinco).
Já no caso da Europa, das 54 repatriações, França registou 17, o Reino Unido oito, o Luxemburgo sete, Espanha sete e a Alemanha seis.
As repatriações de homens continuam a ser substancialmente superiores às de mulheres: 90 contra 29.
Em 2020, e com o objetivo de “mitigar os efeitos da crise pandémica de covid-19”, o Estado português concedeu um apoio financeiro extraordinário, temporário e pontual a 78 nacionais carenciados em seis países: Brasil, Panamá, Peru, Venezuela, África do Sul e Moçambique.
Nesta ajuda, foi despendido o montante de 51.760,47 euros, segundo se refere no relatório.
No Apoio Social a Emigrantes Carenciados das Comunidades Portuguesas, destinado a portugueses com residência legal e efetiva no estrangeiro, em situação comprovada de absoluta carência ou evidente fragilidade, não superável pelos mecanismos existentes no país de acolhimento, foram empregues 78.325,70 euros.
Beneficiaram deste apoio 44 requerentes: Venezuela (41), África do Sul (um), Brasil (um) e México (um).
Em relação ao Apoio Social a Idosos Carenciados das Comunidades Portuguesas (ASIC-CP), destinado a emigrantes portugueses com 65 ou mais anos e em situação de absoluta carência, não superável pelos mecanismos existentes no país de acolhimento, foi efetuada uma despesa global de 764.531,63 euros.
No relatório indica-se que, no quarto trimestre de 2020, encontravam-se em pagamento 317 beneficiários, distribuídos por nove países: Brasil (170), Moçambique (41), Venezuela (40), África do Sul (38), Zimbabué (15), Angola (5), Uruguai (4), Argentina (3) e Essuatíni (1).
Ao associativismo, um setor muito afetado pela pandemia de covid-19, devido ao cancelamento de iniciativas decorrentes das limitações impostas, o Estado português apoiou 34 associações, distribuídas por 12 países, o que representou um encargo de 491.588,31 euros.