Junho é o mês dos Santos Populares em Portugal, com festas e arraiais por todo o país, e também nas comunidades. Sardinhas assadas, manjericos, fogo de artifício, caldo verde, música, martelinhos, fogueiras, balões, tudo isto faz parte do simbolismo das celebrações. Desde o Santo António ao São Pedro, sem esquecer o São João, de Lisboa ao Porto, passando por Nova Iorque, em junho não falta festa bem popular, bem portuguesa.
Santo António
Os concelhos de Aljustrel, Amares, Cascais, Ferreira do Zêzere, Lisboa, Proença-a-Nova, Reguengos de Monsaraz, Vale de Cambra, Vila Nova da Barquinha, Vila Nova de Famalicão, Vila Real e Vila Verde assinalam o seu feriado municipal no dia do seu santo padroeiro, o Santo António, a 13 de junho. As celebrações são várias, a maior parte com início na noite anterior. Para além das sardinhas e dos manjericos comuns a todas as festas dos Santos Populares, há muitos outros elementos que as caracterizam, com destaque para os vários acontecimentos que se tornaram icónicos na capital portuguesa.
Os pontos altos das Festas de Lisboa englobam os Casamentos de Santo António, na Sé de Lisboa. Como manda a tradição, os Noivos trocam alianças a 12 de junho, numa cerimónia que conta igualmente com os Casais de Ouro, abençoados em 1972 pelo santo padroeiro da cidade. Depois dos casamentos, marchar pelo título de Alfama. É na Avenida da Liberdade que desfilam, todos os anos, 20 marchas a concurso, representativas do trabalho ensaiado durante várias semanas em alguns dos principais bairros e freguesias lisboetas. Destaque também para os arraiais de rua nos bairros típicos da capital, como Alfama, Graça, Bica, Mouraria ou Madragoa.
Santos Populares regressam a Lisboa depois de dois anos de paragem “forçada”
As Festas de Lisboa 2022 decorrem entre 28 de maio e 30 de junho. Este ano, as casas regionais da cidade também se juntam ao programa das festas, com ranchos folclóricos, tunas, bombos e fado na Quinta das Conchas, num encontro de dois dias, em 25 e 26 de junho.
As Marchas Populares também estão de volta, com as primeiras exibições no Altice Arena, nos dias 3, 4 e 5 de junho, a partir das 21:00. Depois, na noite de Santo António, de 12 para 13 de junho, as marchas voltam a descer a Avenida da Liberdade, a partir das 21:45, num desfile que será encabeçado pela Marcha Popular de Vale do Açor, convidada desta edição, e com a participação, pela primeira vez, da Marcha Infantil das Escolas de Lisboa.
São João
Das três grandes festas populares portuguesas, o São João é a que origina maior número de feriados municipais. São mais de 30 os concelhos que lhe prestam devoção de forma oficial a 24 de junho, seja no Norte (Porto, Vila Nova de Gaia, Braga, Guimarães, Vila do Conde, Gondomar, Vizela, Castelo de Paiva ou Terras de Bouro), na região centro (Figueira da Foz, Tabuaço, Nelas, Aguiar da Beira, Lousã, Moimenta da Beira, Sertã ou Figueiró dos Vinhos), no sul (Alcácer do Sal, Mértola, Moura, Castro Marim ou Tavira), nos Açores (Angra do Heroísmo, Horta, Lajes das Flores ou Santa Cruz da Graciosa), na Madeira (Calheta e Porto Santo) e até na Grande Lisboa (Almada e Alcochete).
No Norte é onde se assinala a data com mais intensidade, principalmente no Porto e em Braga. Na Cidade Invicta até lhe chamam “a noite mais longa do ano”, com ponto de comparação possível apenas com o réveillon. Quando a noite de 23 de junho dá lugar à madrugada de 24, à meia-noite, ocorre o ponto alto das festas no Porto, com o fogo de artifício lançado em iniciativa conjunta com os vizinhos de Gaia, e leva dezenas de milhares de pessoas a olh¬rem para o céu junto ao Douro, já que o fogo é lançado a partir da Ponte D. Luís I e de plataformas instaladas no rio. Este espetáculo de cor costuma durar cerca de um quarto de hora.
Da tradição também faz parte o chiar dos milhares de martelinhos coloridos, com que se bate na cabeça dos outros transeuntes, sejam ou não rostos conhecidos. Há quem prefira utilizar o alho-porro, igualmente divertido, mas mais desagradável para os visados, tal o cheiro que deixa na pele e na roupa.
Este ataque de martelinhos e alhos¬-porros estende-se da Ribeira até à Foz, onde se multiplicam as fogueiras, as cascatas de São João e a sardinha assada, sem esquecer os Aliados ou mesmo a Boavista.
São Pedro
O dia 29 de junho, dia de São Pedro, é celebrado um pouco por todo o território nacional, de concelhos a norte como Macedo de Cavaleiros, Alfândega da Fé, Celorico de Basto e Felgueiras, a outros a sul, como Sintra, Montijo, Évora e Castro Verde. Por ser conhecido como santo dos pescadores, celebra-se também em municípios piscatórios, como o nortenho Póvoa de Varzim, o algarvio Lagos, o madeirense Ribeira Brava e o açoriano Lajes do Pisco. São estes últimos que lhe mostram mais devoção através de festividades.
A Noitada de S. Pedro leva todos os anos milhares de pessoas à Póvoa de Varzim, localidade onde muitos emigrantes originários do norte de Portugal têm uma casa para passar férias. Para além das sardinhas, dos manjericos, da música popular e do fogo de artifício, que chega a prolongar-se por períodos próximos dos 20 minutos, destaca-se o fervor com que as rusgas são encaradas.
O estádio do Varzim Sport Club serve de palco para as rusgas de bairros como Mariadeira, Regufe, Belém, Norte, Sule Matriz, desde as apresentações dos infantis aos participantes seniores. Os habitantes destes bairros poveiros torcem fervorosamente pelos seus, que nem as claques de futebol que visitavam este estádio aquando dos tempos áureos do clube local.
Na manhã seguinte, aqueles que conseguirem tirar o pé fora da cama podem deslocar-se à tradicional Missa de São Pedro, na Igreja da Lapa. A tarde é ocu-pada por vários concertos de entrada gratuita, até que a Majestosa Procissão de S. Pedro saia da Igreja Matriz.
Como são festejados os Santos Populares nas comunidades
Luxemburgo
As festas dos Santos Populares no Luxemburgo são do mais semelhante que se pode encontrar à realidade portuguesa. Festas ao ar livre, dezenas de portugueses e lusodescendentes a dançarem música popular, outros tantos agarrados a um bocado de pão coberto por uma sardinha ou uma fêvera. Aqui, quase todas as cerca de 60 associações de portugueses organizam uma ou mais festas, seja no Santo António, no São João ou no São Pedro, com a particularidade de existir a facilidade em encontrar os produtos adequados às festas populares, praticamente tudo ainda mais barato do que em Portugal.
França
Em muitos pontos da geografia francesa os Santos Populares são celebrados com o máximo possível de similaridade à realidade portuguesa. Exemplo disso acontece em Bordéus, onde a associação Alegria Portuguesa de Gironde organiza uma grande festa perto da data do São Pedro, com o objetivo de celebrar também o Santo António e o São João. P¬ra além da comida típica, esta festa inclui atuações de grupos de folclore e de bandas que interpretam música popular portuguesa.
Alemanha
Em Hamburgo, as várias associações portuguesas combinam entre si as festas que lhe cabem organizar a cada ano, para que umas não tirem pessoas às outras. A organização dos Santos Populares cabe a uma associação chamada Juventude do Minho, que todos os anos se esmera na realização das festas de São João, não fosse este o padroeiro de cidades como Braga e Guimarães. Este ano não vai fugir à regra, com o arraial a saber e a soar tal e qual como as celebrações por terras minhotas.
Estados Unidos
Em Nova Iorque há mais de uma dezena de festas relacionadas com os Santos Populares, organizadas pelas diversas associações, num estado onde residem 50 mil portugueses. Newark e Mineola são as zonas mais ativas neste aspeto, com festas marcadas em honra de Santo António, de São João e de São Pedro.
Canadá
As sardinhas, a broa e os ingredientes para o caldo verde chegam com facilidade a diversas zonas canadianas, com destaque para o estado de Ontário. Para além de Santo António, São João e São Pedro, também há quem faça festa em honras do Espírito Santo, no final de maio. De origem portuguesa, foram implementadas por açorianos em várias regiões do Brasil e da costa leste dos Estados Unidos e do Canadá. A Casa dos Açores de Ontário, sediada em Toronto, é uma das várias associações que se encarregam da organização de festas do Divino Espírito Santo.
Brasil
Todos os municípios no Rio Grande do Sul, o estado brasileiro mais a sul, têm um santo como referência, como padroeiro do município. Na cidade de Bento Gonçalves, o padroeiro é o Santo António de Lisboa, pelo que o feriado municipal é a 13 de junho. O dia é assinalado por diversas comemorações, como missas, uma procissão e almoços festivos com bailaricos à portuguesa.
Macau
O Arraial de São João é um dos festivais tradicionais do povo português e da comunidade macaense de Macau, sendo realizado em junho. É no Bairro de São Lázaro, que os portugueses se juntam para a festa bem à portuguesa, onde não faltam as sardinhas, o caldo verde, o folclore e a boa disposição. Este ano, e pela terceira vez consecutiva, o arraial não se realizará, devido às restrições pandémicas atualmente em vigor no território e também a problemas financeiros das associações organizadoras.
Sardinha: a rainha da mesa portuguesa
A nossa sardinha goza de boa reputação dentro e fora de portas. O reconhecimento é antigo, como comprova o recenseamento de peixes do litoral do desembargador Duarte Nunes de Leão, no século XVI: “No mesmo mar de Setúbal e no de Sesimbra, sua vizinha, há a sardinha mais saborosa que se pode dar”. Consta que, em 1855, as sardinhas de Setúbal alcançaram menção honrosa na Exposição Internacional de Paris.
Associada à alimentação popular, mas cada vez mais utilizada por grandes chefs, é iguaria indispensável nas festas populares de junho: Assada na brasa, sobre o pão e com pimentos assados, como manda a tradição.
A abundância deste peixe na costa portuguesa e a grande tradição piscatória explicam a forte presença da sardinha à mesa dos portugueses. É o peixe que junta o melhor que Portugal tem, porque se come no Verão, e porque está ligada à nossa identidade.
Falar em Santos Populares é, pois, falar da nossa cultura, da nossa sardinha, de Portugalidade. E é nos bairros mais antigos que as ruas se enchem de animação, decoradas com manjericos, balões e diversos motivos feitos em papel colorido, remetendo-nos para um ambiente de alegria, música e cor, que se mistura com o fumo das fogueiras e das sardinhas assadas na brasa.
De corpo alongado, sub-cilíndrico, azul ou verde prateado no dorso e prateado no ventre e sem raios espinhosos é a nossa sardinha. E quem não gosta da típica sardinha assada?
Durante séculos, as sardinhas exerceram um papel importante nos hábitos alimentares dos portugueses. Um alimento associado à alimentação popular, onde, outrora, muitos comiam apenas uma sardinha por refeição, ou até a dividiam com os demais elementos da família. Os rapazes ficavam com a cauda, por ter mais carne e por terem eles trabalhos mais pesados.
A Sardinha era um peixe que estava relacionado a classes mais desfavorecidas. Por ser um peixe abundante, que há por toda a costa, era mais barato e seguia para o interior também em conserva. Por isso é que se tornou um peixe popular, o que também explica que se associe às celebrações populares. Era costume esfregar a sardinha no pão para dar sabor, como se diz “fazer o peixe render”. Hoje, as sardinhas são uma iguaria, apreciada por todos.
O único tempero que se quer é sal grosso e as sardinhas só devem ser salgadas pouco tempo antes de ir para a grelha, que se quer bem quente. O segredo é saber grelhá-la na perfeição. Tipicamente, são servidas com batata cozida e uma salada de pimentos com cebola ou simplesmente sobre uma fatia de pão, comida à mão.
E as festas dos Santos Populares não seriam as mesmas sem o cheirinho a sardinhas no ar. Como diz o ditado: “No São João, a sardinha pinga no pão”. A verdade é que pinga durante o verão inteiro. Embebe o pão com a gordura que liberta tornando um petisco inigualável. É nesta altura do ano que a sardinha aumenta a sua percentagem de gordura sendo que a melhor época é no final de julho, agosto e setembro.
A sardinha é a rainha das mesas portuguesas, com certeza. É tradição. É momento de união.