A TAP terá sido lesada em 444 milhões de dólares pela compra de 53 novos aviões de vários modelos da Airbus e por ter desistido da encomenda de 12 aeronaves A350. Estes indícios levaram o Ministério Público a abrir um inquérito.
A notícia é avançada pelo jornal online Eco nesta quarta-feira, 8 de fevereiro, que cita uma análise da Airbone Capital.
No ano passado, a TAP tentou renegociar o contrato com a Airbus e percebeu que estava a pagar mais do que a concorrência. Foi quando pediu uma avaliação à Airborne Capital, especialista em leasing de aviões. A consultora irlandesa estima que a TAP estará a pagar cerca de 254 milhões de dólares acima do valor de mercado.
O “prémio” que a companhia aérea está a pagar situa-se entre os 20% e os 28% face ao cobrado a outras companhias aéreas, quando comparado com os preços mais baixos, e entre 3% a 13% quando comparado com os preços mais altos.
A Airborne Capital comparou os valores cobrados à TAP com os de outras dez encomendas do mesmo tipo de aviões. Somando o que a transportadora portuguesa teria poupado nos A350 com o que alegadamente estará a pagar a mais pelos novos aviões, chega-se a um montante de 444 milhões.
O Ministério Público abriu esta semana um inquérito ao negócio de compra de aviões feito entre a Airbus e David Neeleman e que permitiu ao empresário de nacionalidade americana e brasileira controlar a TAP.
Ministério Público de Portugal abre investigação à compra de aviões por anteriores administrações da TAP
O Procurador-Geral da República (PGR) revelou que o “envolvimento à época do ministro das Infraestruturas e Habitação (Pedro Nuno Santos) e do ministro das Finanças (Fernando Medina) resultou em inquérito do Departamento de Investigação Criminal Português (DCIAP)”.
O procurador-geral não especificou se a investigação tem suspeitos ou suspeitos legais, limitando-se a afirmar: “Está em curso uma investigação e sujeita a segredo de justiça”.
O ministro das Infraestruturas disse em outubro de 2022 que a administração da TAP tinha pedido uma auditoria por suspeitar que estava a pagar um valor que não devia ter pago pelos seus (novos) aviões (frota) que era mais do que os seus concorrentes teriam pago e que o governo havia encaminhado essas conclusões ao Ministério Público.
A investigação incide sobre alegada corrupção relacionada com a compra financeiramente prejudicial de 53 aviões da Airbus sob o comando do ex-acionista da TAP e magnata das companhias aéreas David Neeleman. Neeleman teria recebido dinheiro da Airbus com a negociação da nova frota de aviões da companhia aérea, que terá depois usado para comprar a sua participação de 61% no capital da TAP através da Atlantic Gateway.
A Atlantic Gateway era o consórcio de que também participava o acionista minoritário da TAP, Humberto Pedrosa, proprietário da Barraqueiro.
Por outras palavras, o Ministério Público português está a investigar se a TAP acabou por pagar a conta da participação de 61% de David Neeleman, depois de o magnata das companhias aéreas ter usado o dinheiro que ganhou ao enganar a companhia aérea em encomendas de aeronaves.
Voltando a 2012, quando o Governo tinha tentado, mas sem sucesso privatizar a companhia aérea, o governo do PSD de Pedro Passos Coelho privatizou 61% da TAP no final de 2015 ao único comprador credível que apareceu, David Neeleman, dono da companhia aérea brasileira empresa Azul.
Antes de investir o capital social na TAP, David Neeleman decidiu renegociar a encomenda existente de 15 airbus A350, decidindo não comprar esses aviões e optou por um contrato para fornecer toda uma frota de 53 aeronaves: 14 Airbus 330 – 900 Neo e 39 Airbus A320 e Airbus A321 Neo.
Segundo fontes sindicais e noticiado pelo ECO, a TAP e a Finnair teriam sido as primeiras empresas a receber os novos A350 e como primeiros clientes a TAP esteve envolvida no desenvolvimento de um novo modelo, tendo os engenheiros de Engenharia e Manutenção da TAP ido para a fábrica da Airbus fábrica em Toulouse. E estando, entre os dois primeiros clientes, a TAP viria a conseguir os novos aviões a um preço consideravelmente mais baixo.
O argumento utilizado para comprar produtos novos e não testados comercialmente por um preço de saldo não é muito diferente do caso em que Portugal comprou protótipos de veículos anfíbios a um preço inferior ao fabricante austríaco Steyr há mais de uma década e que desapareceram posteriormente.
É que as companhias aéreas maiores não queriam ser as primeiras a comprar centenas desses aviões de nova geração porque apresentavam riscos por não terem sido testados e testados ao longo do tempo no mercado e preferiam ver como as companhias aéreas menores fizeram a feira primeiro.
Nas negociações com a Airbus, David Neeleman alterou a posição da TAP — segundo as mesmas fontes a sua companhia aérea Azul teria direito a receber um ou dois A350 — e avançou com a encomenda de 53 aviões para a TAP. (A330 e A320 Neo) A Airbus, que posteriormente tinha uma longa lista de espera pelos A350, conseguiu então vendê-los por um preço muito superior ao que a TAP inicialmente pensara que iria pagar.
Alega-se que 70 milhões de euros desta alteração de ordem e preço foram utilizados por Neeleman para comprar a sua participação maioritária na TAP. Ou seja, a suspeita é que depois de negociar uma barganha para os novos aviões, ele renegociou o negócio por um preço mais alto em detrimento da companhia aérea e do Estado que ainda detinha o controle acionário.
O empresário brasileiro abordou o negócio em entrevista à revista portuguesa de atualidade Visão quando disse: “O que fiz foi ir à Airbus e dizer que não queria os aviões A350 porque a TAP podia passar sem eles. Mas eu queria o A330 e o A321 (Long Range) porque eram mais rentáveis”.
Com o A321 LR a TAP podia voar para Toronto, Boston, Nova Iorque e até Chicago a custos mais baixos”, disse David Neeleman. “Não levei nada da TAP. Estou trazendo todo esse valor e não consigo sacar um centavo até que o empréstimo bancário da TAP esteja todo pago”, disse na entrevista na época.
A TAP justificou no relatório financeiro anual de 2015 a alteração da encomenda para os aviões mais caros porque funcionaria como uma “diminuição do custo por passageiro”, porque os “novos aviões eram mais baratos e mais eficientes para operar em rotas de longo curso onde A TAP estava a investir mais”.
No ano passado, o Governo recebeu uma auditoria ao contrato dos 53 novos Airbus negociado por David Neeleman que revelou que a empresa estava a “pagar mais pelos aviões do que os clientes concorrentes” com “custos financeiros mais elevados”.
Foi quando a TAP tentou renegociar o contrato com a Airbus que a discrepância foi descoberta.
A auditoria, encomendada pela TAP, contou com a assessoria de duas sociedades de advogados e uma consultora internacional no âmbito de suspeitas de corrupção e gestão financeiramente prejudicial.
A auditoria foi entregue ao órgão de investigação criminal do Ministério Público, DCIAP, pelos ministérios das Infraestruturas e das Finanças.
Privatização da TAP vai “em breve” ao Conselho de Ministros
O processo de privatização da companhia aérea TAP irá “em breve” ao Conselho de Ministros, disse o ministro das Finanças, Fernando Medina.
“Espero poder em breve apresentar ao Conselho de Ministros o arranque do processo de privatização da TAP”, disse o ministro, em Madrid, numa conferência de imprensa ao lado da ministra dos Assuntos Económicos de Espanha, Nadia Calviño.
Medina afirmou que devido ao “muito bom desempenho que a TAP está a ter, um desempenho muito acima das perspetivas relativamente ao cumprimento do plano de reestruturação”, este, é “um bom momento para o Governo avaliar e decidir relativamente ao curso da privatização da companhia”.
Segundo o ministro, esta é “a principal conclusão” do “trabalho exploratório” e “indicativo” de um “pré-estudo de mercado junto de potenciais investidores” que a TAP já fez para “precisamente aferir o que seriam e o que são as perspetivas de investimento” de eventuais interessados na empresa.
“O Governo está a desenvolver os trabalhos prévios e necessários para poder dar início ao processo de privatização da TAP, o que faremos com a brevidade possível, mas também com a atenção necessária a um processo desta dimensão e desta exigência”, disse o Fernando Medina, antes de afirmar a intenção de em breve levar o dossiê ao Conselho de Ministros.