As Terras do Demo têm um “potencial imenso” por explorar, mas é preciso que os seis municípios da região de Viseu que o compõem se unam e dialoguem com os seus habitantes, defendeu hoje a investigadora Ana Lopes.
“Há muito potencial com o património literário e todas as tipologias que queira e, neste caso em concreto, há um potencial imenso que está completamente em bruto” nas Terras do Demo, afirmou a investigadora Ana Isabel Lopes.
Segundo explicou, “há muita pouca coisa que se faça em termos de sustentabilidade e políticas globais de valorização deste território e, em particular, com este pendor literário, porque quer se queira, quer não, Aquilino Ribeiro é uma figura incontornável” desta região.
Em 1919, nascia a obra ‘Terras do Demo’, de Aquilino Ribeiro, residente em Soutosa, Moimenta da Beira, mas foi o trabalho de Carlos Alberto Medeiros, em 1985, que esteve na base de estudo de Ana Isabel Lopes.
Este professor, contou, definia os concelhos de Aguiar da Beira, Moimenta da Beira, Penedono, Sátão, Sernancelhe e Vila Nova de Paiva como as Terras do Demo, e são também as localidades que Ana Isabel Lopes encontrou, “em supremacia, nas 16 obras” que analisou de Aquilino Ribeiro.
“Há uma imagem de marca ligada aos territórios que não é positiva, até pela denominação Demo, mas isso tem a ver também com algum terminismo geográfico, mas há um filão imenso a explorar, mas depois há as barreiras administrativas e políticas nas estratégias de intervenção com que nos esbarramos sistematicamente”, considerou.
Conclusões que tirou na sua tese de doutoramento, aprovada com distinção e louvor, sobre geografia humana nesta região, onde tentou “dar uma configuração ao território, a partir da valorização literária de um autor filho da terra”.
“Elas [as fronteiras] têm que existir, mas há uma sucessão de subdivisões administrativas, municipais e supramunicipais, que, muitas das vezes, acabam por colidir e por não permitir aquilo que efetivamente se pretende, quer para as Terras do Demo, quer para a generalidade do interior do território português que sofre de despovoamento, de forma gritante”, considerou.
No seu entender, “o sucesso de implementação de políticas acaba por não se alcançar, porque depois entra-se num jogo de capelinhas” e, “muitas vezes, o superior interesse das populações é colocado em causa com este tipo de questões, que não são de hoje”, registou.
Ana Isabel Lopes vincou que o objetivo do trabalho não era político e admitiu que não sabe, “nem quis saber, quais os partidos no poder para ter liberdade” na realização do trabalho, mas reconheceu que estas diferenças, “muitas vezes, inviabilizam completamente algo que podia ser feito”.
Sem a solução nas mãos, defendeu que “falta muito a aproximação às pessoas e são elas que constituem os territórios e as paisagens que Aquilino descreve” nas suas obras e, “com exceção para as sedes de concelho, as freguesias continuam iguais um século depois” e “muito dificilmente se conseguirá uma reversão total do que está a acontecer”.
Com base em dinâmicas rurais semelhantes noutros países, defendeu que “terá de haver uma interação e um comprometimento muito grandes dos agentes locais com os atores locais, porque de outra maneira, se andar cada um para seu lado (…), quando estas pessoas morrerem, não há ninguém que venha e que continue e os territórios vão-se apagando”.
Território que, no seu entender, é composto por “concelhos com dinâmicas regressivas, com índices de envelhecimento superiores a 200%, com crescimentos naturais negativos e com perdas populacionais brutais”.
“Aquilo que nos fica, daqui a meia dúzia de dias, são as ditas paisagens do despovoamento, são os muros, são as casas fechadas e não fica mais nada. É o retrato da memória e mais nada”, lamentou, enquanto avisava que “o turismo não é solução para todos os problemas”.
Mas, acrescentou, Aquilino Ribeiro “pode ser uma âncora de uma estratégia que enquadre o próprio turismo, nomeadamente literário, mas numa estratégia económica, social, de desenvolvimento muito mais alargada que não pode ser confinada a concelhos para que estas questões não se esbarrem nas tomadas de decisão”.