Há países em que a comunidade portuguesa faz a diferença, o que, por si só, é razão para merecerem uma atenção muito particular. O importante não é tanto o tamanho, a população ou a riqueza, mas sim capacidade que a comunidade tem para moldar um relacionamento bilateral. No fundo, como em tudo, o que realmente interessa é o fator humano.
O Principado de Andorra é um desses países. Tem apenas cerca de 77 mil habitantes, é a sexta nação mais pequena da Europa, tem um curioso sistema de copríncipes, mas tem cerca de 11% de portugueses no total da população, bem integrados e muito considerados, a que acrescem os andorranos de origem portuguesa. A comunidade portuguesa em Andorra é a segunda maior, a seguir à espanhola e antes da francesa.
Andorra sempre foi conhecida pelo comércio, pelas estâncias de ski e pelos serviços financeiros, mas também pela incontornável presença portuguesa na hotelaria, na restauração, no comércio ou na construção. Mas não se fica por aqui. Os descendentes de portugueses estão também em todos os outros setores de atividade, da saúde às forças de segurança, da administração aos serviços financeiros e, cada vez mais, na política.
Por isso, a representação diplomática e consular deve ser pensada em função desta realidade, em que a valorização da comunidade se constitui como um forte contributo para o aprofundamento das relações bilaterais e vice-versa. Daí que Portugal tenha decidido entre os anos 2000 e 2002, e bem, dar dignidade à representação portuguesa no Principado, criando uma secção consular e uma embaixada, o que permitiu à comunidade ir somando conquistas e adquirir mais reconhecimento e visibilidade. Tinha uma representação à altura da Espanha e da França e praticamente os mesmos direitos, o que era um natural motivo de orgulho e de coesão da comunidade.
Porém, em 2012, o então Governo do PSD tomou a decisão infeliz de encerrar a embaixada e a secção consular, a que pessoalmente sempre me opus, deixando os portugueses desamparados e sem qualquer apoio durante mais de um ano, obrigando-os a ir ao Consulado-Geral de Barcelona para tratar dos seus documentos, o que implicava a perda de um dia de trabalho.
A verdade é que, desde então, a comunidade tem perdido dinamismo, coesão e representatividade. Deixou de realizar iniciativas mobilizadoras e as relações económicas, culturais e políticas diluíram-se. Deixou de haver quem trabalhe para unir e afirmar a comunidade. O consulado de Barcelona está demasiado longe e a embaixada em Madrid ainda mais.
Tirando o Grupo de Folclore-Casa de Portugal, que ainda vai promovendo iniciativas culturais que honram os dois países, o restante movimento associativo tem vindo a perder expressão nos últimos anos e algumas associações tiveram mesmo que fechar as portas.
Ao mesmo tempo, porém, a excelente relação institucional entre os dois países tem sido reforçada, como demonstra o facto de Portugal ter retirado Andorra da lista dos paraísos fiscais no início deste ano, ou a adesão do Principado ao estatuto de observador associado da CPLP ou ainda a parceria estratégica no âmbito da cimeira Ibero-Americana. Portanto, com todo este contexto, justifica-se plenamente a abertura de uma estrutura consular de carreira, de forma a valorizar devidamente as relações diplomáticas, facilitar a revisão de acordos, promover a ação cultural e o ensino da língua, incentivar as relações económicas, melhorar a representação em eventos oficiais, apoiar a coesão e dinamização da comunidade, entre outros aspetos relevantes da relação bilateral.
Portugal devia, por isso, ter um posto consular de carreira, e não apenas um Consulado Honorário em Andorra, para reforçar as relações bilaterais em todas as dimensões e valorizar a importante comunidade portuguesa, o seu papel na sociedade e a forma extraordinária como é considerada.