Isabelle Coelho Marques também não teve tempo para assimilar bem o que acontecera naquela manhã de 11 de setembro, pois nos dias a seguir aos atentados trabalhou horas a fio no Consulado Geral de Portugal em Nova Iorque. A sua missão era clara: tentar localizar portugueses que trabalhavam ou estavam no WTC, a pedido das suas famílias.
O Ministério dos Negócios Estrangeiros português criou uma linha telefónica especial para dar assistência a estas famílias e os pedidos eram encaminhados para o consulado em Nova Iorque. “Foi um trabalho duro e longo, de milhares de contactos” para tentar localizar tantas pessoas, algumas nem sequer trabalhavam nas Torres, mas as famílias pensaram logo no pior, recorda ao Contacto. Ainda hoje fica “arrepiada” ao recordar aquela manhã.
“Lembro-me de tudo, passaram-se tantos anos, mas parece que foi ontem”, assumiu a ex-funcionária consular que hoje é presidente da New York Portuguese American Leadership Conference (NYPALC) e membro do Conselho da Diáspora Portuguesa.
Mas aquele dia até começou bem e Isabelle saiu de casa com um sorriso nos lábios. “Era uma manhã perfeita de setembro, quente, mas com uma brisa, e a luz parecia quase a luz de Lisboa”, recorda. Por isso, nem acreditou quando o taxista imigrante que a transportou da Central Station ao Consulado Geral de Portugal, no Rockefeller Center, lhe disse num inglês rudimentar que “um avião tinha batido nas Torres Gémeas”. Impossível, deve ter compreendido mal, pensou.
Quando chegou ao consulado percebeu que a informação era real e logo de seguida mandaram evacuar o edifício. Foi quando chegou à rua que Isabelle teve o primeiro grande impacto. “Estava polícia por todo o lado e todas as pessoas a sair dos edifícios. Havia carros de polícia com megafone a pedir às pessoas para se dirigirem a um dos extremos da ilha e milhares de pessoas a caminhar em silêncio. Parecia que estava num filme de ação, daqueles protagonizados pelo Bruce Willis”, diz.
Durante a caminhada pelas avenidas ladeadas de arranha-céus “não conseguíamos ver nada, mas a meio do caminho alguém disse que uma das torres tinha caído. Muita gente chorava em silêncio”. Só quando chegou junto à margem do Rio Hudson e olhou para o centro de Manhattan viu uma nuvem enorme de fumo, “parecida com a da bomba atómica”.
Depois, “vimos a segunda Torre a cair, as pessoas começaram a abraçar-se umas às outras e a chorar. Desconhecidos abraçados em choro”, relembra. “Foi um choque imenso. E ali fiquei até o meu ex-marido ir ter comigo e irmos para casa”. O percurso da saída da cidade demorou horas, e nos carros “toda a gente estava em silêncio”. Mas, no sentido contrário, “a fila era igualmente enorme de carros de bombeiros e de polícias que se dirigiam para o centro da cidade para ajudar a salvar pessoas”.
Nos dias e semanas seguintes as emoções de continuaram à flor da pele. O seu trabalho intenso era pautado pelo som das gaitas de foles tocadas nas cerimónias fúnebres da Capela de St. Patrick, ao lado do consulado. “Muitos dos funerais dos bombeiros e polícias realizaram-se nessa Capela, e eu que antes gostava do som daquele instrumento, já não o consigo ouvir pelas memórias que me traz”, confessa.
Vinte anos se passaram, mas ainda hoje esta portuguesa estremece “cada vez que ouço um avião a passar por cima de Manhattan. Olho logo para cima, é instintivo”. Para Isabelle Coelho- Marques, o 11 setembro trouxe uma “sensação de vulnerabilidade e insegurança muito grande”. Ainda lhe custa a creditar que “o coração da América foi atacado daquela forma tão violenta e ímpar. E tememos que volte a acontecer”.