O Tribunal de Contas (TdC) remeteu para o Ministério Público o negócio da compra de catamarãs elétricos pela Transtejo, depois de a operadora de transporte de passageiros ter adquirido em concurso público internacional dez embarcações, nove delas sem as baterias necessárias para navegar.
A Transtejo pretendia agora adquirir as baterias necessárias, à parte, em ajuste direto por 15,5 milhões de euros (além dos 52,4 milhões relativos às dez embarcações). Mas o Tribunal de Contas recusou o visto à compra e remeteu o negócio para o Ministério Público para apuramento de responsabilidades financeiras ou mesmo criminais por parte dos gestores da transportadora.
Segundo o jornal Público, o TdC destaca a irracionalidade do negócio: “É como comprar um automóvel sem motor, uma moto sem rodas ou uma bicicleta sem pedais”.
A compra de baterias em falta seria feita agora à mesma empresa espanhola que vendeu as embarcações, Astilleros Gondan, e não diretamente ao fabricante destes equipamentos, a empresa Corvus Energy, numa solução que o Tribunal de Contas também não compreende.
“A resposta só pode ser uma: havendo um intermediário, aumenta o preço”, dizem os juízes.
O acórdão do Tribunal de Contas acusa também a Transtejo de ter enganado o órgão na obtenção do visto para a primeira aquisição, depois de a transportadora ter indicado inicialmente que pretendia lançar um novo concurso público para a compra de baterias.
São também listadas “contradições” da Transtejo. Por exemplo, a Transtejo alega que não tinha dinheiro suficiente para a compra de embarcações com baterias perante uma autorização do Governo para despesa até 57 milhões de euros com mais 33 milhões para manutenção. O TdC sugere que a empresa comprasse menos barcos, mas completos.
A transportadora argumenta também com o risco de perda de fundos europeus para o financiamento caso optasse por outro fornecedor de baterias, uma vez que soluções de outras empresas obrigariam a alterar o projeto de construção das embarcações e à emissão de novas certificações marítimas.
Governo aceita demissão. Transtejo terá nova administração em “breve”
O Ministério do Ambiente revelou, esta quinta-feira, que aceitou o pedido da administração da Transtejo de exoneração de funções, no seguimento da polémica em torno da compra dos navios sem baterias. O Governo promete para “breve” o anúncio da nova equipa que vai liderar a empresa.
“Na sequência do acórdão do Tribunal de Contas tornado hoje público, sobre o concurso para aquisição de baterias para a nova frota elétrica da Transtejo, entendeu a administração da Transtejo/Soflusa apresentar a sua demissão à tutela. O pedido foi aceite. Em breve será anunciada a nova administração da empresa”, pode ler-se no comunicado enviado às redações.
A tutela adianta ainda que “constituiu uma equipa dedicada a apoiar a empresa na decisão que garanta a aquisição de baterias, em data aproximada à que estava prevista para a chegada dos barcos”.
“O objetivo é permitir a disponibilidade das baterias nos prazos adequados, de modo a não impactar na operação da nova frota”, explica o Executivo.
O conselho de administração da Transtejo/Soflusa, que assegura ligações fluviais no rio Tejo, pediu hoje a exoneração, após um relatório do Tribunal de Contas (TdC) que acusa a empresa de “faltar à verdade” e de práticas ilegais e irracionais.
Em causa está a compra de nove baterias, pelo valor de 15,5 milhões de euros (ME), num contrato adicional a um outro contrato já fiscalizado previamente pelo TdC para a aquisição, por 52,4 ME, de dez (um deles já com bateria, para testes) novos navios com propulsão elétrica a baterias, para assegurar o serviço público de transporte de passageiros entre as duas margens do Tejo.
“A Transtejo comprou um navio completo e nove navios incompletos, sem poderem funcionar, porque não estavam dotados de baterias necessárias para o efeito. O mesmo seria, com as devidas adaptações, comprar um automóvel sem motor, uma moto sem rodas ou uma bicicleta sem pedais, reservando-se para um procedimento posterior a sua aquisição”, considerou o TdC.
Segundo o Tribunal, “o comportamento da Transtejo, com a prática de um conjunto sucessivo de decisões que são não apenas economicamente irracionais, mas também ilegais, algumas com um elevado grau de gravidade, atinge o interesse financeiro do Estado e tem um elevado impacto social”.
“O procedimento foi bem feito e promoveu o interesse público”, respondeu hoje a presidente do conselho de administração, Marina Ferreira, em declarações aos jornalistas no Terminal Fluvial do Cais do Sodré, em Lisboa.
Para a gestora, as considerações do Tribunal de Contas são “ofensivas e ultrajantes”.
A Transtejo é responsável pela ligação do Seixal, Montijo, Cacilhas e Trafaria/Porto Brandão, no distrito de Setúbal, a Lisboa, enquanto a Soflusa faz a travessia entre o Barreiro, também no distrito de Setúbal, e o Terreiro do Paço, em Lisboa. As empresas têm uma administração comum.