Não têm sido muitos os momentos de divergência clara entre Marcelo Rebelo de Sousa e o Governo desde que o país foi atingido pela pandemia – talvez o mais evidente tenha sido a pressa do Presidente da República para declarar o primeiro estado de emergência, quando o primeiro-ministro não estava convencido dessa necessidade.
Mas, esta semana, passado o sufoco do pior pico da covid-19, e em fase de normalização, ficou clara uma dessas raras dissonâncias.
Como salienta o Público no destaque da edição de hoje, Marcelo contesta os peritos – que defendem a manutenção da atual matriz de risco -, enquanto António Costa… se deixa ficar em silêncio. O Diário de Notícias também puxa por esta divergência a que o Governo responde, por enquanto, mudo.
Mas o silêncio do Governo não poderá manter-se por muito mais tempo, sob pena de significar uma escolha. Se nada fizer para mudar os critérios de avaliação de risco que vão marcando o passo ao desconfinamento, Costa estará a colocar-se do lado dos cientistas, contra o Presidente da República. Neste caso, adiar uma posição será tomar uma posição.
Marcelo está preocupado com a necessidade de reabrir a economia e relançar o emprego, e com a “perceção pública” perante regras que foram desenhadas quando ainda não havia a proteção vacinal que tem crescido e continua a crescer, protegendo já, pelo menos, os mais idosos e vulneráveis. Adalberto Campos Fernandes, o primeiro-ministro da Saúde de António Costa, concorda com o PR. Ao Público, critica o “exagero” das atuais regras, alerta para o risco de “não adesão” da população, e diz que “o Governo tem de ter a coragem para ir libertando a economia”.
Por falar no risco de “não adesão” às regras:
- são cada vez mais as concentrações de jovens, sobretudo nos tradicionais locais de diversão noturna – e faz sentido a pergunta: os jovens perderam o medo?
- por estes dias não têm faltado exemplos de desrespeito pelas regras sanitárias que ainda estão em vigor no país. Tanto por nacionais como por turistas, sobretudo ingleses. No Algarve, bebem em contrarrelógio e não há máscaras que lhes valham. No Porto, que este fim de semana está a abarrotar de ingleses por causa da final da Champions, é o vale tudo. No caso dos ingleses, com uma agravante: trata-se do país europeu onde a variante indiana mais cresce – sobre esses riscos, escrevo na segunda parte deste Novo Normal.
Numa fase em que a testagem é essencial para controlar a pandemia, e muitos jovens têm resistido a essa ideia, o Ministério da Ciência e do Ensino Superior avisou que universidades e politécnicos podem exigir aos alunos testes à covid-19.
Ainda sobre a covid: após algumas semanas de indecisão, a Direção-Geral de Saúde recomenda agora que quem levou a primeira dose da AstraZeneca receba a segunda dose da Pfizer ou da Moderna. Enquanto a DGS não avançou com esta recomendação, mais de 80 mil pessoas que receberam a primeira dose da AstraZeneca foram, entretanto, vacinados com a segunda dose da mesma marca.
Filipe Santos Costa / ECO