O ex-banqueiro, de 79 anos e diagnosticado com Alzheimer, não compareceu, tal como os restantes acusados, na leitura de decisão instrutória, marcada por um protesto tenso, no Campus de Justiça de Lisboa, de cerca de meia centena de lesados do BES.
Um ano e meio depois do início da instrução, então a cargo do juiz Ivo Rosa, entretanto substituído, o juiz Pedro Santos Correia demorou menos de 30 minutos a comunicar a decisão instrutória, abdicando de apresentar publicamente a sua fundamentação.
No despacho, a que o JN teve posteriormente acesso, o magistrado sustenta, porém, que, à exceção das características formais e jurídicas da acusação do Ministério Público, as questões levantadas pelos arguidos, “ao carecerem de prova que ultrapassa o conceito […] de indício suficiente, devem ser discutidas e apreciadas em fase de julgamento” e não de instrução.
“A acusação não é uma ‘mão cheia de nada’ e não assenta em imputações genéricas, desprovidas de factos concretos e circunstanciados”, sublinha Pedro Santos Correia, numa resposta direta às alegações da defesa do ex-banqueiro, acusado, entre outros crimes, de associação criminosa, corrupção ativa no setor privado e burla qualificada.
Para o magistrado, não restam, de resto, dúvidas de que os indícios que constam da acusação apontam para uma “maior probabilidade de condenação dos arguidos”, incluindo por associação criminosa.
“A organização que todos estes arguidos implementaram e executaram, com recurso a criação de empresas entre outros expedientes, mediante sofisticados e complexos métodos de ilegitimamente retirar dinheiro ao BES e aos seus clientes, sob a égide da chefia liderada por Ricardo Salgado, permitem concluir que os mesmos constituíram uma associação criminosa”, argumenta o juiz.
Além de Ricardo Salgado, acusado de 65 crimes, vão a julgamento Amílcar Morais Pires, considerado o braço direito do então presidente do BES, e o antigo contabilista do banco, Francisco Machado da Cruz. Outros dois arguidos viram cair os crimes de infidelidade, por terem prescrito, sem que tal impeça que sejam julgados por outros ilícitos.
O tribunal confirmou ainda o fim dos procedimentos criminais contra José Manuel Espírito Santo, por ter, entretanto falecido, e quatro empresas, por questões processuais já decididas ao longo da instrução. Cinco bancários, que já tinham sido ilibados pelo Ministério Público, também não vão a julgamento.
À saída do tribunal, o advogado de Ricardo Salgado, Francisco Proença de Carvalho, insistiu que o seu cliente é inocente e criticou o facto de a instrução ter sido um “mero cumprimento de calendário”.
11,8 mil milhões de prejuízos alegadamente causados ao BES/GES pelos arguidos. Segundo o Ministério Público, estes terão, em benefício pessoal, transformado o grupo numa espécie de castelo de cartas, suportado por operações fraudulentas e subornos. A acusação é de julho de 2020.
1300 lesados do BES com estatuto de vítima no processo. É a primeira vez que aquele estatuto, que pode facilitar a obtenção de uma compensação financeira, é atribuído a ofendidos de crimes económico-financeiros e não violentos.