PSD anuncia que vai votar contra o relatório “feito à medida” do PS e que Montenegro considera um “branqueamento político completo”. IL critica “farsa” e nem vai apresentar propostas de alteração. Bloco acha “incompreensível” ver acontecimentos no Ministério das Infraestruturas e SIS fora do relatório. Chega considera relatório um “embaraço” e acusa o Governo ser autor do mesmo.
O relatório preliminar da Comissão Parlamentar de Inquérito à TAP, apresentado ao final da noite da passada terça-feira, não aponta interferências políticas, não deixa críticas ao papel de Pedro Nuno Santos na gestão da companhia nem a João Galamba. A relatora, Ana Paula Bernardo, justificou a exclusão de polémicas com Frederico Pinheiro e com os serviços de informações por não se tratar de um “diário” da CPI e por não serem assuntos ligados à TAP. As explicações da socialista não convenceram a maior parte dos partidos da oposição que pedem alterações na versão final.
O deputado do PSD Paulo Moniz anunciou que o PSD irá votar contra o relatório preliminar da CPI à TAP, considerando que o documento é “levezinho” e quer “branquear os factos”, como a ingerência do Governo na gestão da companhia aérea. “O relatório é parcial e leve, não tem em conta as audições”, começou por afirmar o coordenador do GP do PSD na comissão de inquérito.
“O PS demonstrou não resistir à tentação porque o PM havia dito que queria retirar consequências políticas no final. Este relatório foi feito com objetivo e à medida para que as consequências não existam”, sustentou.
Afirmando que ficou demonstrada a “anuência” e “ingerência” do Governo na gestão diária da TAP; Paulo Moniz deu como exemplo o caso da frota automóvel ou o pedido do ex-secretário de Estado Hugo Mendes para alterar um voo do Presidente da República.
Segundo o deputado social-democrata é “incompreensível” que o documento omita também os acontecimentos da noite de 26 de abril no ministério das Infraestruturas e o recurso ao SIS para a recuperação do computador do ex-adjunto de João Galamba. “É um facto de uma gravidade muito, muito grande, no quadro da democracia e do funcionamento das instituições e é apagado deste relatório, o que é inadmissível. Branquear estes factos é ligeireza e roça a leviandade com o objetivo de o PM dizer que não tem necessidade de retirar consequências políticas”, insistiu.
“Tudo isto são razões bastas para que o PSD vote contra este relatório”, concluiu Paulo Moniz, acrescentando que o partido irá apresentar as suas próprias conclusões da CPI.
Na reunião com o INEM, Luís Montenegro aproveitou para endurecer o discurso e multiplicar críticas ao relatório preliminar da TAP. O líder do PSD considerou o documento um “branqueamento político completo” da ação dos membros do partido socialista envolvidos na gestão pública da TAP como Pedro Nuno Santos e João Galamba. Para o social-democrata existem omissões “intoleráveis” de conteúdos discutidos nas longas audições da CPI. “É uma vergonha democrática que se olhe para as audições e se decida não incluir nada nas conclusões”. E acrescentou: “é uma desvalorização do papel dos deputados no escrutínio e apuramento de factos”.
Sem poupar nas críticas à versão preliminar, Montenegro considerou as conclusões “estritamente socialistas”, “facciosas”, sem “valor nenhum” e mostram “posição de força do PS”. E ainda lembrou que a “maior preocupação” do documento foi incluir um “comentário” sobre a privatização de 2015, encabeçada pelo Governo social-democrata de Pedro Passos Coelhos.
Mesmo depois do seu partido já ter anunciado o voto contra, o líder do PSD disse que ainda há “tempo” para os deputados dos vários partidos “convergirem” no acerto do relatório.
“Estamos perante uma obra de ficção que contraria a realidade”, disse Rui Rocha, que acusou também o relatório da CPI à TAP de ser feito à medida do PS. Para o líder liberal, há uma “diferença brutal” entre o que é dito no relatório e e o que foi ouvido nas audições da comissão de inquérito, além de não haver “referências adequadas” e “profundas” aos 3,2 mil milhões de euros injetados na TAP para os portugueses perceberem se “investiram” ou “enterraram” dinheiro na companhia aérea. “Onde está a avaliação política para que os portugueses percebam o que foi feito a esse dinheiro?”, questionou.
Rui Rocha considerou ainda que “foram varridas para debaixo” do relatório todas as responsabilidades de Fernando Medina e João Galamba. O documento, sublinhou, foi feito com base num “trabalho meticuloso” para que o primeiro-ministro não possa retirar nenhuma consequência política no final, tal como prometeu.
Na terça-feira, o deputado liberal Bernardo Blanco já tinha afirmado que esperava que o relatório não tivesse “considerações ideológicas” e fosse “factual” face ao processo de privatização de 2015, ao processo de recompra de 2017 e ao processo que, na prática, foi de nacionalização em 2020. E já admitia que a relatora, a socialista Ana Paula Bernardo, não deveria incluir alguns episódios de “ingerência política” na TAP.
“O relatório parece feito à medida de João Galamba e do primeiro-ministro”, atirou Pedro Filipe Soares. O líder parlamentar do Bloco considera “incompreensível” que as polémicas da noite de 26 de Janeiro não sejam incluídas no relatório. “É incompreensível que haja omissão, buraco completo do relatório, que parece feito à medida dos interesses de João Galamba e do primeiro-ministro. Se tivesse sido escrito por eles não seria muito diferente”. Para o bloquista estes eventos fizeram parte do trabalho dos deputados na CPI e devem estar incluídos tal como os restantes eventos. Esta “omissão”, diz o bloquista, serve para que o primeiro-ministro não seja obrigado a tomar “conclusões políticas”. “O primeiro-ministro vai usar este relatório para não retirar consequências políticas quando o país já percebeu que João Galamba não se devia manter como ministro das Infraestruturas”, reiterou.
“Dizer que João Galamba não teve nenhum tipo de papel relevante na tutela política da TAP não faz sentido. Então o que aconteceu em janeiro de 2023 quando João Galamba promoveu uma reunião entre a CEO da TAP e o grupo parlamentar do PS? Não mostra como a relação era promiscua entre um grupo parlamentar partidário e a CEO de uma empresa publica? Na demissão da CEO, João Galamba não existiu? E a apresentação de resultados que não aconteceu porque a tutela política deu ordens para que não acontecesse, isso deve ser ignorado?”, questionou Pedro Filipe Soares. E resumiu: “Há uma tentativa de condicionar conclusões da CPI para não se retirar quaisquer consequências políticas, em particular em relação a João Galamba”.
Apesar das críticas de “encenação”, o líder parlamentar do Bloco não deixou claro se o partido irá votar contra o relatório. “Vamos fazer um conjunto de propostas de alteração”, relevou Pedro Filipe Soares. Só depois, quando fôr conhecido o relatório final e as modificações incorporadas, é que o partido irá revelar intenções de voto.
Pelo PCP, Bruno Dias defendeu que o relatório da CPI à TAP tenta “justificar” a privatização da TAP e “ignora” as consequências da decisão para a companhia aérea, a começar pelos fundos Airbus.
“Não se pode enterrar ainda mais fundo o conhecimento e consequência deste tipo de situações”, advertiu o deputado comunista.
“Os problemas económicos e financeiros da TAP deviam ser resolvidos sem sacrificar postos de trabalho e salários. Mas o processo de privatização avança a todo o gás, com factos consumados e prejudicando o futuro da companhia”, vincou.
De acordo com o deputado comunista, o relatório demonstra que falta uma “gestão pública rigorosa” com vista à defesa dos interesses do Estado. “Hoje coloca-se em causa o futuro da empresa, repetindo os mesmos erros”, lamentou.
“Tenho a certeza de que este relatório foi escrito pelo Governo e enviado para o PS ontem à noite”, atirou André Ventura. O líder do Chega considerou que o relatório apresentado por Ana Paula Bernardo é um “frete” ao Governo e acusou o PS se interferir diretamente na redação do relatório para impedir que António Costa retire “consequências políticas”. “António Costa veio dizer que tiraria consequências políticas após conhecer o relatório, agora sabemos que disse isso porque foi feito por ele. É fácil dizer que vamos tirar consequências políticas quando sabemos que do relatório não vai sair nada”.
Para o líder do Chega é preciso incluir no relatório a “informalidade” da gerência pública da TAP, a “responsabilização” de Pedro Nuno Santos e Hugo Mendes na indemnização a Alexandra Reis, a atuação de João Galamba e os acontecimentos no ministério das Infraestruturas, assim como a “parcialidade” que atribui “responsabilidades” ao anterior Governo de Passos Coelho. Sem estas alterações, a versão preliminar apresentada pela socialista Ana Paula Bernardo é um “embaraço para o parlamento”, uma “vergonha” e uma “encomenda” do Governo.
Ainda assim, o Chega vai “propor melhorias” antes da relação final do documento. “Ainda acreditamos que o PS pode ter um arrepio de consciência para que o relatório não saia assim para o país”.
O PS foi o último partido que participou na CPI à TAP a reagir ao relatório preliminar, depois das críticas atiradas pela oposição de interferências e “fretes” na redação do mesmo. Bruno Aragão não deixou críticas nem elogios ao relatório de Ana Paula Bernardo. O deputado socialista disse apenas que a “preocupação” da CPI deve ser “apurar factos” para lá das “interpretações políticas” que cada um possa ter em relação a esses factos.
Sobre as críticas da oposição, Bruno Aragão pediu “cuidado” aos partidos para que não se “precipitem” numa “leitura rápida” do documento. “Se independentemente da factualidade que se apura, da base documental, se cada um de nos mantiver o argumentário da fase inicial da CPI, de pouco valerá o esforço das últimas semanas”, atirou. Em resposta aos jornalistas, o socialista disse ainda que esta “narrativa” de tentativa de culpabilização do PS já existia no início da CPI e não vê “diferenças” nas acusações lançadas nesta tarde.
Sem desvendar a esperada luz verde do PS na aprovação do relatório, Bruno Aragão adiantou apenas que o partido irá “analisar” se apresentará “propostas de melhorias ou conclusões” que ache “pertinentes”.
O relatório preliminar da CPI à TAP apresenta 75 conclusões, mas rejeita pressões do Governo sobre a companhia área e sai em defesa de Pedro Nuno Santos, frisando que o despedimento de Alexandra Reis foi da responsabilidade da ex-CEO Christine Ourmières-Widener. De fora do documento, com 180 páginas, ficou ainda o incidente da noite de 26 de abril no Ministério das Infraestruturas e o recurso ao SIS para a recuperação do computador do ex-adjunto do ministro Frederico Pinheiro.
Apesar das críticas, a relatora rejeitou esta quarta-feira que o documento seja parcial: “Isto não é uma versão do Partido Socialista. É uma versão provisória do documento”, garantiu Ana Paula Bernardo, acrescentando que haverá “total disponibilidade” do PS para analisar em comissão as propostas de alteração e potenciar “melhorias”. Já o primeiro-ministro escusou-se a comentar as conclusões do relatório da CPI à TAP e disse que só retirará consequências políticas na sequência da versão final do documento.
O relatório final será discutido e votado no próximo dia 13 de julho no Parlamento.
.