Vitória Machado tem 25 anos e há dois anos emigrou para Alemanha para prosseguir o sonho da enfermagem. A progressão na carreira e o contacto com outras culturas levaram-na a despedir-se de Portugal. Há duas semanas mandou uma carta à presidente da Comissão Europeia e teve a resposta em plena Cimeira Social da União Europeia (UE), no Porto. “Comecei a chorar, fiquei muito emocionada”, disse.
É ainda com a voz meia trémula e entre muitos risos que a jovem do Porto fala, este sábado, sobre as palavras que Ursula Von der Leyen, presidente da Comissão Europeia, lhe dirigiu em resposta à carta que a jovem lhe enviou há duas semanas.
A reação emocionada não é para menos. O nome de Vitória Machado, de 25 anos, foi mencionado no primeiro dia da Cimeira Social da UE, no Porto, perante vários chefes de Estado e de Governo europeus. “É tão bom ter referido o nome de uma simples enfermeira. Que bom que ela [Von der Leyen] tenha dado este reconhecimento”, contou, ao JN, numa conversa telefónica.
Formada na Escola Superior de Enfermagem do Porto (ESEP), Vitória candidatou-se através de uma empresa de recrutamento a um trabalho num hospital da Alemanha. Está no país há dois anos, já depois de ter tido experiência profissional em Portugal.
Apesar de ser orgulhosamente portuguesa, critica a falta de progressão na carreira, o pouco reconhecimento e a precariedade na enfermagem, que foram motivos suficientes para procurar outras soluções dentro da União Europeia. “Tenho tido muita sorte, senti-me muito integrada”, afirma.
Na Alemanha, a portuguesa aderiu ao programa “Eures”, que ajuda os cidadãos dos Estados-membros da UE a procurar emprego e a instalar-se noutro país. Ainda como estudante, já tinha beneficiado no mesmo país do programa Erasmus, de mobilidade académica entre países europeus. Vitória Machado confirma que recebeu um apoio de 1040 euros para começar a vida na cidade alemã de Viersen, após arranjar emprego no hospital geral St. Irmgardis Krankenhaus Süchteln. No primeiro voo migratório, teve a viagem de avião paga entre Portugal e a Alemanha.
Quanto à língua alemã, não foi um impedimento. O hospital onde até então trabalhava – em breve vai mudar-se para outro – não se importou que não dominasse o idioma e aconselhou-a a tirar um curso. Por essa formação, a jovem recebeu um apoio de cerca de 2000 euros. “Uma das primeiras coisas que nos perguntam na Alemanha é se queremos estudar mais. Se sim, eles [empregadores] pagam tudo”, adianta.
Missiva enviada há duas semanas
Apesar de viver há dois anos na Alemanha, foi apenas há duas semanas que decidiu enviar uma mensagem por email e carta a Ursula Von der Leyen. Vitória Machado tinha dois objetivos: felicitar a presidente da Comissão Europeia por ser a primeira mulher no cargo e depois agradecer o apoio que a União Europeia lhe tinha dado durante a procura de emprego e a estabilidade que agora tem num país que não é o seu.
Consciente de que “ser jovem hoje em dia é muito difícil”, com a falta de reconhecimento e de meios financeiros até para pagar a renda de uma casa, a portuguesa sente que conseguiu a segurança pessoal e profissional por viver na Europa. Não quis falar mais sobre as condições laborais em Portugal, mas acredita que a força da União pode ajudar a dissipar muitas das desigualdades e injustiças sociais, sobretudo para os mais novos. Na carta a Ursula Von der Leyen escreveu mesmo: “Juntos somos mais fortes”.
A presidente da Comissão Europeia retribuiu a generosidade da mensagem e esta sexta-feira, primeiro dia da Cimeira Social da UE, no Porto, afirmou que Vitória tinha “toda a razão”. “Juntos somos mais fortes, juntos podemos cumprir as nossas regras sociais e fazê-las funcionar para todos os europeus. Juntos podemos cumprir a promessa da Europa”, acrescentou.
Lágrimas e a força do elogio
Este sábado de manhã, a portuguesa que não sabia que estava a decorrer uma cimeira europeia, embora seja atenta às questões da UE, não conteve as lágrimas quando os pais lhe ligaram para contar a boa nova. “Acredito muito na reciprocidade do elogio. Gostava que os elogios se tornassem mais banais do que as reclamações”, respondeu, para justificar o envio da carta. Para esta “filha” da UE, as fronteiras não existem, e a existirem, são apenas mais um motivo para uma entreajuda entre nações e povos. “Sem guerras”, conclui.