Em 2019, o ano do último exercício orçamental não condicionado pela pandemia, o Governo propunha-se levar por diante um amplo programa de valorização da nossa administração no plano interno e na vertente externa. É bom recordar que foi o ano do único excedente orçamental da nossa história mais recente, então amplamente publicitado.
Relativamente ao Ministério dos Negócios Estrangeiros cumpre recordar algumas das grandes metas então assumidas como grandes prioridades para esse ano.
Dizia então o Governo que, entre outros, eram seus objetivos “o incremento das ações da cooperação para o desenvolvimento e a expansão dos programas de internacionalização da língua e cultura portuguesa” e ainda “a continuação da modernização da rede e dos serviços consulares, designadamente através do reforço dos recursos humanos, da simplificação dos procedimentos e da utilização dos meios eletrónicos de atendimento e processamento de serviço”.
Por isso, ficamos estupefactos quando, há uns dias, ao analisarmos os dados que nos foram transmitidos pelo próprio Governo através da Conta Geral do Estado de 2019, concluímos que afinal aconteceu exatamente o contrário do então propagandeado em pleno período pré-eleitoral.
O que ficámos a saber é que foram geradas poupanças cerca de 6 milhões de euros no orçamento do Ministério dos Negócios Estrangeiros através do não preenchimento de postos de trabalho previstos no mapa de pessoal e com a saída de funcionários, sobretudo nos serviços externos do MNE, o que obviamente se repercute hoje gravemente nas enormes fragilidades que o serviço consular possui e que o impede de corresponder de forma minimamente eficaz às exigências da nossa política externa e às necessidades dos utentes.
Neste domínio, é igualmente bom recordar que o novo sistema informático de gestão consular, os espaços do cidadão e os novos centros de atendimento centralizados foram igualmente anunciados ou lançados nessa altura ou mesmo em finais de 2017, não tendo desde então praticamente conhecido evolução significativa com impacto real no atendimento consular em termos globais, que, aliás, se encontra em colapso na generalidade dos grandes postos da rede.
Foi também em finais de 2018, no decurso da apresentação do Orçamento para 2019, que o Governo, através do Ministro dos Negócios Estrangeiros, veio anunciar com “pompa e circunstância” o compromisso da revisão da tabela salarial dos funcionários dos Serviços Periféricos Externos do MNE e, muito particularmente, dos trabalhadores das nossas estruturas diplomáticas e consulares no Brasil, situações que igualmente se arrastam, desde então, sem fim à vista.
Por todas estas razões e muitas outras, nos mais variados domínios da governação, não é difícil confirmar agora as denúncias de demagogia que nós próprios e muitas outras pessoas então fizemos. Os números não enganam e é o próprio Governo através deste Relatório quem o vem agora afirmar.
Por isso se percebe agora melhor por que razão os nossos serviços consulares atravessam uma das piores fases da sua história, com quase total incapacidade prática para responder às necessidades dos utentes. Desperdiçou-se um momento fundamental para fazer investimentos que agora seriam essenciais para superar estas carências, podendo-se então evitar uma boa parte dos problemas que afetam as nossas Comunidades quando procuram gozar as suas mais do que merecidas férias.
Já não basta a terrível pandemia que veio arrasar as nossas vidas e ainda somos obrigados a lutar contra a incapacidade de alguns para antecipar os problemas do futuro.
Espero que saibamos retirar as necessárias lições de situações como esta que, cumpre recordar, ocorreram fora de qualquer contexto de crise.
Lisboa, 7 de Julho de 2021
José Cesário
Deputado do PSD por Fora da Europa